26 de junho de 2010

Florianópolis e a tarifa do ônibus

A prefeitura de Florianópolis novamente nos brindou com um aumento nas tarifas de ônibus recentemente. A notícia é de maio de 2010, mas poderia ser de 2006, 2007, 2008 ou 2009 (duas vezes!). Em 2004 e 2005, aumentos na tarifa foram revogados devido à força das manifestações populares, porém desde então as reivindicações da sociedade não têm alcançado vitórias claras, apesar de acontecerem anualmente.

A julgar pelo tamanho das manifestações, pela organização e pelo apoio da sociedade como um todo, este ano parece propício para novamente barrar um aumento que é ilegítimo (a tarifa mais cara do país, com aumentos muito acima da inflação, para um serviço ruim, etc.). Porém, impedindo ou não o aumento, o movimento terá fracassado se não fomentar com toda a população a discussão sobre a importância do transporte coletivo em garantir o direito constitucional de ir e vir, além de ser fundamental para diminuir a poluição, melhorar a mobilidade urbana e a qualidade de vida geral.

Tarifa nova
Os ônibus são essenciais para a locomoção de uma grande parcela da sociedade, que não pode ou não quer ter carros e motos. Eles transportam muito mais gente com menor gasto de espaço e combustível – ou seja, por menos dinheiro e poluição. Porém, devido ao serviço ruim e caro, não é justo cobrar da população que troque o conforto e a autonomia do carro pessoal pelo ônibus lotado e com poucos horários, especialmente quando essa troca nem valeria a pena financeiramente! Pedro Magalhães, estudante de Engenharia Mecânica da UFSC, fez os cálculos para um carro que rode 10km por litro, a um preço de 2,50R$ por litro de gasolina, além de mais 0,10R$ a cada quilômetro em manutenção do carro, e sumarizou os dados no gráfico abaixo. Dirigir oito quilômetros sozinho de carro é mais barato que ir de ônibus!


Como pode um meio de transporte incrivelmente mais eficiente custar mais caro? A resposta é que o sistema é gerido por empresas, apesar de ser um serviço público. E, ao contrário dos governos que precisam ao menos conquistar metade da população uma vez a cada quatro anos, as empresas podem se preocupar direta e unicamente com seus lucros. Oficialmente, a prefeitura deveria fiscalizar a qualidade do serviço e tem poder legal para retirar a concessão das empresas, caso elas não estejam satisfazendo a população. No entanto, o que vemos é nosso prefeito ratificando todo ano os aumentos na passagem. Dário Berger se elegeu em 2004 com a proposta de abrir a “caixa preta” do transporte público, mas até hoje os lucros dos donos das empresas não são divulgados. Inclusive, o período legal da concessão das companhias que fornecem o serviço expirou em 2009, mas ainda não foi feita nova licitação.

Tarifa zero
Na contra-mão da valorização do transporte individual poluidor e ineficiente, existe a proposta da municipalização do serviço e da instituição da tarifa zero – transporte coletivo gratuito. Tal medida seria um grande incentivo para o uso dos ônibus, provavelmente acabando com os congestionamentos diários, diminuindo muito a poluição do ar da nossa cidade, a queima de combustíveis fósseis geradores de gases do efeito estufa e o gasto com novas estradas, viadutos, túneis e manutenção das ruas cada vez mais tomadas por carros. Além do mais, propiciaria o acesso livre à cidade como um todo para a população inteira, não apenas para os privilegiados motoristas.

Obviamente, alguém precisa bancar salários dos motoristas, manutenção, frota, combustível, etc. Porém, assim como a saúde e a educação públicas, esse serviço poderia ser pago indiretamente pela população através dos impostos. Mas isso não mudaria a situação caso não fossem instituídos impostos graduais, relativos à renda de cada família. Assim, quem tem muito pagaria muito; quem não tem, não paga. Todos teriam acesso pleno à cidade e uma nova política de redistribuição de renda seria implantada, fomentando justiça social. Existem outras opções: tributação sobre combustível e carros ou sobre os maiores geradores de tráfego, como indústrias, comércio e shopping centers, que também se beneficiariam do livre trânsito dos trabalhadores e demais habitantes da cidade.

A ideia parece utópica, mas ela já foi implementada e bem-sucedida em muitas cidades no mundo todo. Hasselt, na Bélgica, foi a primeira cidade do mundo a possuir passe livre em todas as suas linhas de ônibus, em 1996. Em dez anos, o uso de ônibus aumentou mais de 13 vezes e atualmente Hasselt possui poucos carros nas ruas (13x menos), mas muitos ônibus e bicicletas. Até na cidade de São Paulo, no início da década de 90, houve tarifa zero em alguns bairros da cidade, durante o governo de Luiza Erundina, à época do PT, mas que não foi mantido pelo governo que se seguiu, de Paulo Maluf.

A tarifa zero é viável e altamente positiva para a sociedade como um todo, tanto em termos sociais, visto que propicia a redistribuição de renda e torna real o direito de ir e vir, garantido na nossa constituição, quanto em termos de sustentabilidade, pois o ônibus é um meio de transporte muito mais eficiente, que polui menos e diminui nosso impacto no meio-ambiente. A sua implementação depende, basicamente, de aprovação popular. Se a cidade insistir, os políticos terão que aderir à causa.

Por uma vida sem catracas!

Mais informações:
http://tarifazero.org

http://lataofloripa.libertar.org

http://twitter.com/lataofloripa



Um comentário:

João Gabriel disse...

O texto foi escrito no fim de maio, mas repostado a essa data pra fazer correções técnicas.